Conto - A fonte



– E por que não posso ir até aquela fonte? – indagou o menino que estava junto ao pai na muralha observando as planícies que se estendiam a frente.

– Nos é proibido meu filho – o pai na visão do filho alto, forte olhava para a frente como que perdido em pensamentos – todos os que vão até lá nunca mais voltaram, o nosso senhor preocupado tornou toda aquela área proibida.

O garoto olhava e não entendia, ali de cima do muro de pedra ele apenas via um enorme campo que estendia sem nenhuma árvore, arbusto ou animal que fosse, e lá no horizonte aonde era o limite para a visão, bem ali no limiar do limite, onde era possível ver um pequeno ponto que se levantava no horizonte quebrando a linha reta da terra.

O garoto estendeu a mão para frente e levantou o polegar, fechou um dos olhos e o colocou ao lado da pequena figura que subia lá longe.

– Mas pai, aquela fonte não parece ser grande coisa – disse ele analisando o dedo e a fonte – o meu dedo é muito maior do que ela.

O pai o olhou de cima com um sorriso no rosto e lhe bagunçou o cabelo – Não a subestime, de longe nada é o que parece ser de verdade.

– Você já foi lá papai?

– Nunca, nunca sai da nossa cidade.

– O senhor não fica cansado daqui não?

– Que pergunta filho, não a lugar melhor para se viver do que aqui.

O menino olhou novamente para o dedo e a fonte e deu uma olhada para trás analisando a cidade, um enorme emaranhado de telhados laranja cortados por ruelas e ao centro um castelo e tudo isso protegido por uma enorme muralha de pedra.

– Não sei… – disse o garoto como que perdido em pensamentos.

– Não crie minhocas em sua mente meu filho. Vivemos bem e não nos falta nada para a nossa vida, o nosso senhor sempre cuida muito de nossa segurança.

– Mas eu tenho curiosidade pai – voltou a olhar para o horizonte – o que será que faz os homens não quererem voltar mais, já que aqui temos de tudo para viver.

– Porque quando chegam lá eles morrem – ele não estava gostando do rumo que a conversa ia, tinha que colocar um ponto final logo.

– Ah – a expressão do menino foi de surpresa e medo – tudo bem então.

Os dois voltaram para a sua casa onde sua mãe já estava terminando o jantar.

Depois daquela conversa no muro se passaram sete anos, o menino curioso envelheceu e completou a sua maioridade, completando os seus dezesseis anos, e como de costume em sua cidade ele deveria se casar com a moça de idade mais aproximada da sua e ir para uma casa e começar a sua vida.

– Mas eu não desejo me casar! – gritava ele em casa com o pai.

– Mas é o nosso costume, não há o que você fazer. Daqui a três dias será a cerimônia.

– Não quero me casar e não vou.

– Pelos deuses, de onde vem essa consternação toda?

– Da curiosidade pai, de saber o que existe para além dessas pedras que nos rodeia. De viver uma aventura e não um casamento falso.

– Para de ser estupido! – o pai se exaltou.

O rapaz o olhou sério – Então melhor morrer um estupido, adeus pai, te amo mãe.

– Você vai morrer meu filho, por favor não vá – disse a mãe já em prantos.

– Morrer seria a maior aventura da minha vida e de quebra acabaria com mais uma curiosidade minha.

E saiu da casa correndo se escondeu nas ruelas da cidade esperando a noite para pular o muro.

Quando o dia amanhecia os guardas viam ao longe a figura de uma pessoa andando pelos campos em direção à fonte, o pai o olhava e se podia ver os seus olhos cheios de água.

Ao chegar à fonte ele não morreu como estava esperando, a tocou com receio e não lhe aconteceu nada, na verdade a fonte estava seca e havia uma boa parte dela quebrada.

Ficou passando a mão nela e percebeu que o pai tinha razão “de longe nada é o que parece ser de verdade” chorou pelo resto do dia e acabou adormecendo.

No outro dia ao acordar ainda escuro pensou em voltar para a cidade e pedir perdão aos pais e aceitar o casamento, mas pelo menos ele teria uma coisa a dizer, a fonte não matava, continuou vivo.

Quando voltava se lembrou, eu não olhei no que havia depois da fonte, então voltou correndo e esperou o sol nascer.

À medida que o dia se iluminava ele se surpreendeu, o mundo era muito maior do que ele conseguia conceber em sua mente, havia montanhas e rios, florestas de se perder a vista. Tudo um mundo fantástico.

A fonte ficava no alto de um morro que dava uma visão privilegiada do mundo, para aquele rapaz uma visão que dizia: Descubra-me e decifra-me.

Olhou para trás e viu a cidade ao longe que recebia os primeiros raios solares.

– Você tinha razão pai, as pessoas que chegam aqui morrem, não o corpo, mas foi a minha mente que morreu para nascer uma livre. Me desculpe, mas não posso voltar agora, não hoje nem amanhã, mas vou voltar um dia para lhe contar o que vi nesta imensidão que me chama.

 


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